Regime jurídico das agências reguladoras

Em linhas gerais, as agências reguladoras são pessoa jurídica de direito público interno, criadas por meio de lei, cuja função é a de regular e fiscalizar as atividades de determinado setor privado do país. As agências reguladoras são conceituadas como sendo autarquias sob regime especial, criadas para regular um setor específico da atividade econômica.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello:

(...) as agências reguladoras são autarquias sob regime especial, ultimamente criadas com a finalidade de disciplinar e controlar certas atividades. Algumas das atividades afetas à disciplina e controle de tais entidades são:
(a) Serviços públicos propriamente ditos. É o caso da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL (...)
(b) Atividades de fomento e fiscalização de atividade privada, caso da Agência Nacional do Cinema – ANCINE (...)
(c) Atividades exercitáveis para promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo (...)
(d) Atividades que o Estado também protagoniza (e quando o fizer serão serviços públicos), mas que, paralelamente, são facultadas aos particulares. É o que ocorre com os serviços de saúde, que os particulares desempenham no exercício da livre iniciativa, sob disciplina de controle da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVS (...)
(e) Finalmente, há ainda, agência reguladora de uso de bem público, que é o que sucede com a Agência Nacional de Águas –ANAA (...)[1]
As agências reguladoras foram criadas num momento em que havia forte presença do Estado brasileiro no gerenciamento da economia, desempenhando de forma direta serviços públicos, que de um certo modo levaram à falência do Estado, já que num dado momento o Estado já não conseguia mais custear este modelo. A partir de então, surgiu a proposta de concentrar nas mãos do Estado apenas a execução dos serviços essenciais, delegando à iniciativa privada a execução de funções que dada sua natureza e peculiaridades, poderiam ser desempenhadas pelos particulares, em regime de livre iniciativa ou de direito público Surgiram então as agências reguladoras, cujas atividades seriam executadas pela iniciativa privada, mas controladas e reguladas pelo Estado. Nesta empreitada, o Brasil optou por adotar o modelo de agência reguladora independente norte-americana, como forma de estimular o investimento de capital estrangeiro.
As agências reguladoras foram criadas não apenas para executarem serviços públicos, mas sobretudo, para garantir que esta prestação ocorra da melhor forma possível, prevenindo o Estado contra falhas que poderiam ser causadas por entes não dotados de conhecimento técnico necessário para a consecução destas atividades. Alguns exemplos de agências reguladoras são a ANATEL, ANVISA e ANAC.
Com relação ao regime jurídico das agências reguladoras, a doutrina costuma apenas dizer que as agências reguladoras são “autarquias em regime especial”[2], sem, no entanto, se debruçar profundamente sobre o citado “regime especial”. Fala-se em “regime especial” porque existe a independência em relação ao órgão estatal da administração direta ao qual a agência reguladora está vinculada; mandato e estabilidade dos seus dirigentes para garantir a referida independência; vínculo institucional para os demais servidores que junto a estas agências trabalham; e poder regulatório dos setores das respectivas atuações.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello
(...) Anotou-se que as “agências reguladoras” são autarquias “sob regime especial”. Afinal, em que consistiriam seus regimes especiais? (...) Assim, a lei da ANATEL, em seu art. 8º, § 2º, apresenta como seus traços especificadores “independência administrativa, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo e estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira”. A lei da ANS, no art. 1º, parágrafo único, aponta como caracterizadores de tal regime “autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão de recursos humanos, autonomia nas suas decisões técnicas e mandato fixo de seus dirigentes”; a lei da ANVISA (dantes denominada ANVS), no seu art. 3º, parágrafo único, aponta como caracterizadores de tal regime “independência administrativa, a estabilidade de seus dirigentes e a autonomia financeira” e a lei criadora da ANTT e da ANTAQ indicam, no art. 21, § 2º, que o regime autárquico especial é caracterizado pela “independência administrativa, autonomia financeira e funcional e mandato fixo de seus dirigentes. (nossos grifos) [3]
Arremata o doutrinador:
Ora, ”independência administrativa” ou “autonomia administrativa”, “autonomia financeira”, “autonomia funcional” e “patrimonial e da gestão de recursos humanos” ou de quaisquer outros que lhes pertençam, “autonomia nas sua decisões técnicas”, “ausência de subordinação hierárquica”, são elementos intrínsecos à natura de toda e qualquer autarquia, nada acrescentando ao que lhes é inerente. Nisto, pois, não há peculiaridade alguma; o que pode ocorrer é um grau mais ou menos intenso destes caracteres. (nossos grifos)[4]
Ou seja: não há um consenso doutrinário ou mesmo legal sobre o que seria o “regime jurídico especial” das agências reguladoras.
Se analisarmos as características e o contexto no qual surgiram as agências reguladoras, penso que a idéia e o alcance deste “regime jurídico especial” fica mais clara, na medida em que percebemos a função e a razão da criação destas entidades. Assim, poderemos então entender que o regime jurídico das agências reguladoras nada mais é do que uma independência e liberdade de ação, a fim de que sejam atingidos seus objetivos. A única ressalva que se faz, é que com relação ao tema, há necessariamente a presença do mandato fixo e da estabilidade dos dirigentes das agências reguladoras, o que significa dizer que seus dirigentes gozam de estabilidade e somente poderão ser afastados de seu cargo no caso de cometimento de ato ilícito (necessária condenação judicial transitada em julgado), outros desvios de conduta, ou se a agência não estiver cumprindo a política pública definida nos termos da lei para o setor”[5]

BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA, Bruno Costa de. “Agências reguladoras independentes, atividade regulatória e conflito normativo”. In: Revista Brasileira de Direito Público – RBDP. Belo Horizonte, ano 10, nº 36, jan/mar 2012.
ANDRADE, Flávia Cristina Moura de. Elementos do Direito Administrativo. São Paulo: Premier Máxima, 2005.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2013.
http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/brasilia/14_668.pdf

[1] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2013. P. 174/175.
[2] Neste sentido: ANDRADE, Flávia Cristina Moura de. Elementos do Direito Administrativo. São Paulo: Premier Máxima, 2005. P. 73.
[3] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. Cit. P. 178.
[4] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Ibidem.
[5] ANDRADE, Flávia Cristina Moura de. Op. Cit. P. 74.

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